Reportagem originalmente publicada no jornal O Estado de São Paulo
JBS se arma para convencer a Comissão de Valores Mobiliários de que não praticou insider trading ao comprar bilhões de dólares no mercado futuro semanas antes do vazamento da delação premiada de seus donos
Com seus donos presos há dois meses, a JBS se arma para convencer a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de que não praticou insider trading, que é o uso indevido de informação privilegiada, ao comprar bilhões de dólares no mercado futuro semanas antes do vazamento da informação de que Joesley e Wesley Batista haviam feito delação premiada.
A defesa da companhia baseia-se em três pontos: a decisão de montar posição de US$ 2,8 bilhões apostando que o dólar iria subir foi motivada por projeções de executivos que desconheciam o acordo de colaboração; a JBS fez operações similares em outras ocasiões; e, como presidente da JBS, Wesley tinha o dever de agir no melhor interesse da companhia.
De acordo com a JBS, nos primeiros meses do ano subordinados de Wesley indicaram em reuniões a necessidade de a empresa se proteger da alta do dólar. A partir disso, Wesley tinha obrigação de autorizar a montagem da posição para preservar os interesses da empresa e garantir o sigilo de sua colaboração, afirma o advogado Walfrido Warde, que defende a JBS no caso.
“Do contrário, ele trairia a empresa e violaria o dever de diligência e de lealdade. Temos o que o direito chama de inexigibilidade de conduta diversa”, diz Warde. “Wesley não fez absolutamente nada de diferente do que em todas as outras situações de montagem de hedge.”
Segundo o advogado, a proteção cambial ocorreu ao longo de 12 dias úteis, entre 2 e 17 de maio. Ele diz que, desde 2013, a JBS já montou posições acima de US$ 2,5 bilhões no mesmo prazo em outras três ocasiões: em maio e em junho de 2013 e em janeiro de 2016.
O advogado diz ainda que, no período, posições acima de US$ 1 bilhão foram executadas num único dia em quatro ocasiões: 21 de agosto de 2013, 2 de abril de 2014, 1.º de dezembro de 2015 e 30 de dezembro de 2015.
A defesa diz que não há como enquadrar o caso em insider trading, já que os Batistas, mesmo sabendo do grave conteúdo de sua delação, não tinham como saber o efeito que as revelações teriam sobre a cotação do dólar.
“Estamos falando de negociação com papéis da JBS? Não. A JBS nada tem a ver com definição da taxa de câmbio. Nenhuma vez na história a CVM se deparou com acusação de insider de quem não é insider.”
Para corroborar sua versão, a defesa usará pareceres da brasileira Fipecafi e da firma americana Niera. Ambos indicam que a empresa tinha intenção de se proteger da variação cambial.
Fila. Os indícios de prática de insider trading são base de três dos doze procedimentos administrativos em andamento na CVM desde que o acordo de delação dos Batistas foi noticiada pelo jornal O Globo em maio.